Antão e quê...?

Ler, ouvir, aprender

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Gabriel e Ricardo Antão

  • Ricardo Antão e Gabriel Antão

Já falámos aqui sobre a forma como a tecnologia pode influenciar a criação e execução musical, tendo em conta o fácil acesso à informação que temos ao nosso dispor. E também já abordámos aqui os riscos inerentes a essa influência crescente. Tendo isso bem presente, gostaríamos de abordar diferentes formas de fruir e absorver essa informação, algo que é essencial no mundo da música (e não só).

 

Para adquirir informação, e com ela conseguir criar conhecimento, qualquer pessoa usa predominantemente dois métodos: auditivo ou visual (e, eventualmente, uma combinação de ambos). Na primeira categoria podemos incluir os audiolivros e podcasts, e na segunda os livros, revistas, artigos e material semelhante (os vídeos são um exemplo claro da conjugação dos dois métodos). É certo que existem vantagens e desvantagens em cada um deles, e que cada pessoa terá a sua preferência; ainda assim, quanto melhor conhecermos as estratégias, melhor as aplicaremos. Vamos então a isso.

 

Vamos começar por distinguir audiolivro de podcast. Um audiolivro é uma gravação profissional de um texto/livro existente, havendo casos bastante conhecidos (como as leituras da coleção Harry Potter pelo reconhecidíssimo Stephen Fry, por exemplo). Um podcast é um ficheiro áudio (ou multimédia) que é divulgado com periodicidade regular, e que podemos comparar a um programa de rádio: a sua duração pode variar, e pode ter um ou mais anfitriões e convidados, por exemplo. Estes recursos permitem que utilizemos parte do nosso tempo a aprender enquanto fazemos tarefas em piloto automático, o que não seria possível ao ler um livro (por favor, não tentem conduzir e ler um livro em simultâneo só para nos provar o contrário); os podcasts são também uma plataforma para ouvirmos outras opiniões (por vezes fundamentadas de forma bastante eloquente) ou obter resumos de um grande volume de informação, e podem facilmente cativar o nosso interesse, devido ao registo informal e conversacional. Há também alguns argumentos menos favoráveis a esta abordagem: a ineficácia da aprendizagem em multitasking (falámos dela aqui); os pontos de vista podem ser pouco aprofundados e/ou os participantes podem trocar de tema rapidamente (não dando espaço para reflexão/assimilação); não se pode sublinhar as partes importantes (algo possível num livro) e, se nos distraímos, é mais trabalhoso voltar ao ponto onde estávamos.

 

Passando agora à aquisição de conhecimento de forma visual, é conveniente fazer uma distinção entre livros impressos e livros eletrónicos (o mesmo se aplica a revistas, artigos e material análogo). Há estudos que indicam que a utilização de livros impressos é mais eficaz na retenção de conhecimento comparativamente ao uso de dispositivos eletrónicos¹ pois o facto de o texto impresso estar ancorado a uma página específica ajuda na memorização e retenção de informação, especialmente em textos mais longos e complexos (podem ler um artigo interessante sobre isto aqui). A possibilidade de voltar rapidamente atrás para reler alguma passagem, ou de parar momentaneamente para refletir antes de prosseguir a leitura, são também pontos positivos a ter em conta. E, em termos de velocidade, geralmente a leitura é mais rápida que a escuta: o adulto “médio” lê entre 250 e 300 palavras por minuto, enquanto a velocidade de discurso para uma compreensão eficiente é de cerca de 150-160 palavras por minuto. Mas também podemos apontar alguns detalhes menos favoráveis: alguns textos podem ser pouco apelativos (não havendo o carisma de um apresentador para contornar essa barreira) e algumas informações podem não ser percebidas (a ironia e o sarcasmo, por exemplo, ou diversas camadas de significado que um hábil ator consegue transmitir através da entoação).

 

Em suma, ambas as estratégias têm pontos positivos que nos incentivam a aprender, e é também fascinante que este debate esteja a ser abordado no campo das neurociências: há investigações que estão a estudar e a criar mapas cerebrais sobre o nosso processamento da linguagem (tanto na escuta como na leitura), o que irá abrir portas para novos tratamentos de dislexia e outros transtornos de processamento auditivo.²

 

O futuro, e especialmente o presente, parecem-nos muito promissores. Por isso, o mais importante será desfrutarmos de todas as possibilidades ao nosso dispor, para podermos enriquecer a nossa mente e a nossa vida.

 

 

Bibliografia:

Gemma Walsh (2016) Screen and Paper Reading Research – A Literature Review, Australian Academic & Research Libraries, 47:3, 160-173

Lauterman, T. & Ackerman, R. (2014) Overcoming screen inferiority in learning and calibration. Computers in Human Behavior, Vol. 35.

 

 

¹ Lauterman, T. & Ackerman, R. (2014) Overcoming screen inferiority in learning and calibration. Computers in Human Behavior, Vol. 35.

² https://www.futurity.org/audiobooks-podcasts-reading-brain-maps-2137952-2/

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